Ser misericordioso é compadecer-nos da miséria alheia. Seja da miséria
material, nas formas da carência, do abandono ou da enfermidade, seja da
miséria espiritual, caracterizada pelas mil e uma facetas da imperfeição
humana.
Ser misericordioso é, pois, condoer-nos desses excluídos da sociedade, sem
eira nem beira, que se arrastam pelo mundo, suplicando pão para o estômago,
ou um trapo usado com que cubram sua nudez, socorrendo-os com solicitude.
É
apiedar-nos das crianças órfãs ou abandonadas, interessando-nos pela sua
sorte e contribuindo, como e quanto nos seja possível, para que tenham um
lar que as eduque e prepare para serem úteis a si mesmas e à sociedade,
assim como olharmos pelos velhinhos desamparados, oferecendo-Ihes um abrigo
onde possam aguardar, serenamente, que a morte venha libertá-los das
vicissitudes terrenas.
É
sensibilizar-nos à vista desses desgraçados aos quais a lepra, o fogo
selvagem, o câncer, a sífilis, a tuberculose, etc., hão flagelado e
reduzido à ruína, cujas existências se constituem numa sucessão
ininterrupta de dores, angústias e melancolia, ajudando a minorá-las com os
recursos de nossa bolsa e, melhor ainda, com o bálsamo de nossa simpatia,
das palavras de conforto e encorajamento, das preces e vibrações que
façamos em seu benefício.
Ser misericordioso é, acima de tudo, suportarmos cristãmente os defeitos
daqueles que nos rodeiam, relevarmos os agravos que nos façam, renunciarmos
a todo e qualquer propósito de vingança, não guardarmos ressentimento de
coisa alguma e estarmos sempre prontos a servir, seja lá a quem for, embora
saibamos de antemão que ninguém nos será grato e talvez nem sequer nos
compreenda o gesto fraternal e amigo.
Jesus-Cristo
considera bem-aventurados os que usam de misericórdia, porque, segundo a
Lei, "cada um recebe exatamente o que dá".
Espíritos insipientes que somos, ainda no começo de nossa evolução,
estamos, por isso mesmo, muito sujeitos ao erro. Assim, se não formos solidários
com os que passam por duras provas e expiações, nem formos tolerantes com
as fraquezas e imperfeições do próximo, também não teremos quem nos ajude a
vencer os obstáculos de nossa jornada, assim como nossas próprias culpas e
mazelas não serão toleradas pela Justiça Divina; e isso não por
"castigo", mas para que todos aprendamos a regra áurea,
habituando-nos à "fazer aos
outros aquilo que gostaríamos que nos fizessem".
Ninguém
se iluda a esse respeito, supondo que um arrependimento de última hora, ou
os recursos oferecidos pela sua religião, sejam suficientes para
granjear-lhe à graça de Deus e assegurar-lhe "um bom lugar" nas
moradas celestiais.
Através do "Pai Nosso", suplicamos diariamente ao Altíssimo que
"perdoe as nossas ofensas, assim como perdoamos aos nossos
ofensores".
Pois bem: valorizemos nossas orações, traduzindo em atos tão sublimes
palavras, perdoando, de fato, àqueles que de alguma forma nos tenham
ofendido ou prejudicado.
Levemos, simultaneamente com o nosso perdão, completo e sincero, também o
amor, esse sentimento puríssimo que "cobre a multidão dos
pecados"; só assim, mas só assim, nos inscreveremos entre aqueles a
quem Jesus se referia, ao sentenciar:
"Bem-aventurados os misericordiosos, porque eles alcançarão
misericórdia". (Mateus, 5: 7. ).
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